Sexta-feira da Paixão é dia de fechar o corpo com Milome

Gazeta -16/10/2015 09:45

BRASIL - Seu Élio Duarte não gosta de ir ao médico. Ele não se lembra da última vez em que foi a algum especialista da saúde. Mesmo sabendo que esta prática não é recomendada, garante que tem o corpo fechado. A certeza vem da crença em beber todo ano, sempre na sexta-feira santa, uma infusão de cachaça com o cipó-milome. Há 25 anos, o aposentado reúne a comunidade de Serra Dourada I, no município da Serra, para celebrar a paixão de Cristo na porta de casa.

Na Vila Rubim, o comerciante Ângelo Bernardes, de 21 anos, disse que a venda do cipó-milome aumentou bastante nesta semana. Cada pacote, com 50 gramas do produto, custa em média R$1,5 (um real e cinquenta centavos). O vendedor Donato da Silva, de 66 anos, comentou que o milome serve para muitas enfermidades. 'O cipó é bom para reumatismo, dor no corpo, diabetes e até para soro para veneno de cobra', disse.

Tradição

Este ritual religioso-cultural dá um certo trabalho para seu Élio - que é mais conhecido na região como Élio do Milome. Todo ano ele vai à Vila Rubim, no Centro de Vitória, para comprar o cipó. Gasta em média R$ 20,00 (vinte reais). De Santa Teresa, ele encomenda a cachaça. Feito isso, em casa, prepara a mistura, divide o material em três garrafões de cinco litros cada e guarda a bebida longe do sol, em uma área coberta ou enterrada no quintal. O milome fica curando por um ano.

Passado os 12 meses, Seu Élio vai reunir pela 25ª vez a vizinhança para tomar o famoso milome. Toda sexta-feira da paixão, a comunidade faz a festa na rua Sucupira. 'Tem gente que traz o peixe, outro vem com a torta. Cada um traz alguma coisa. No final das contas é uma festa só. O povo, a cada dose do milome, abre e fecha o corpo', brinca Élio.

Hereditário

Desde criança, seu Élio foi acostumado a fechar o corpo com o milome. 'Meu pai colocava a bebida no dedo ou na chupeta para a gente provar. É uma tradição que aprendi e segui. Meus vizinhos todos compartilham comigo. Independente de crença, eles aparecem. Católicos, evangélicos, espíritas. Não tem distinção. Todo mundo pode beber. Minha religião é Deus', ressalta Seu Élio.

Apesar de ser consumido na sexta-feira da paixão, a igreja não reconhece a crença no milome e define como um rito apenas cultural. Confira, em vídeo, a entrevista com o Seu Élio do Milome.